domingo, 9 de março de 2014

Direita x Esquerda

Em 07/03/14, David Coimbra publica em Zero Hora a crônica O Monstro de Goiânia, falando de um assassino frio e cruel que matou uma mulher em um assalto, diante de seu filho de 1 ano de idade.

Fiquei muito impressionada com a crônica de hoje do David Coimbra na ZH.
Além do óbvio, a narrativa do crime, o que me impressionou foi a clareza da análise sobre as opostas posturas da esquerda e da direita brasileiras em relação à segurança pública, às origens da violência, aos métodos corretivos e/ou punitivos.
Não sou de esquerda. Ando de saco cheio da esquerda e sua profusão de palavras, seu paternalismo incapacitante, sua ditadura velada.
Mas também não sou de direita, porque não concordo com o consumismo desenfreado e devastador e os abismos sociais que ela propicia.
Também não aprovo a manipulação da mídia que ambas exercem com maestria para conduzir sua manada.
E me causa repugnância quando ambas se põem lado a lado nos palanques com fins eleitoreiros, numa demonstração asquerosa de falta de coerência. Não estão dialogando, estão apenas somando números.
Na verdade, me identifico muito mais com a sabedoria do velho Confúcio, que dizia que "a virtude está no meio".
Acredito que enquanto não chegarmos a um meio termo, a um diálogo verdadeiro e de nível elevado entre esquerda e direita, enquanto não abandonarmos os extremismos e os fanatismos políticos, estaremos fadados a isto aí que o Coimbra tão bem descreveu.

Então, chego aos 40

em 27 de fevereiro, completei 40 anos

Então, chego aos 40.
Não sei como funciona para as outras pessoas que chegam nesta idade, mas para mim parece mesmo que há uma marca, um divisor de águas.
A julgar pela longevidade da família, pelo histórico fisiopatológico dos meus ascendentes, pela evolução das ciências da saúde que estendem cada vez mais a existência, e considerando talvez um pouco de sorte ou proteção divina que me mantenham distante de algum acidente de percurso, devo ter chegado, mais ou menos, naquilo que deve ser a metade da minha vida.
Suponhamos que o tempo que eu tive até agora seja o tempo que tenho pela frente. O que eu vejo?
Para começar, vejo uma mulher bem mais interessante do que aquela dos anos anteriores. Salvo umas poucas vezes em que um descontentamento generalizado toma conta de mim, eu gosto muito do que vejo no espelho todos os dias, e gosto mais ainda daquilo que deposito sobre o travesseiro a cada noite. Eu gosto desta pessoa que os anos construíram. Eu gosto do que eu sei, eu gosto do que eu sinto, e me agrada muito também essa capacidade que eu tenho de perceber quando não estou gostando de alguma coisa... e muda-la.
Chego à segunda metade da vida com muito mais projetos do que tive na primeira. Com um humor melhor. Com mais vontade de realizar meus sonhos. Finalmente, aos 40 anos, eu tenho um sonho! Até aqui, fui vivendo um dia depois do outro, aproveitando oportunidades à medida que surgiam, mas nunca havia planejado nada para mim. Agora eu tenho um sonho! E uma possibilidade concreta de realiza-lo!
Eu nunca parei para pensar em como seria minha vida aos 40. Mas se tivesse pensado, acho que não teria me imaginado como estou agora.
Eu que fui uma adolescente quase esquálida, magérrima, jamais me imaginaria bem acima do peso ideal.
Eu que não queria ter filhos até coisa de dez anos atrás, hoje não conseguiria me ver em outra condição que não a de mãe.
Eu que não vivia sem uma televisão, totalmente viciada em novelas e mais uma meia dúzia de programas, hoje esqueço de ligar aquela que já foi a minha grande companheira.
Eu que idolatrava meus professores da faculdade, que me considerava uma grande profissional, que achava que a farmácia era minha verdadeira vocação, que ser farmacêutica era tudo o que eu poderia fazer de melhor na vida, hoje estou determinada a fazer outra coisa, seguir outros caminhos, deixar a farmácia de lado. Hoje eu sequer compreendo como alguém com o meu tipo de personalidade, com o meu perfil, cometeu esta falha na escolha profissional. E quem diria que, chegando aos 40, eu teria coragem para corrigir a rota?
Nem tudo são flores, evidentemente. Embora a capacidade de analisar o que eu vejo tenha se aprimorado com o tempo, a visão propriamente dita está cada vez pior. E está difícil me convencer de que aqueles óculos que estão na caixinha, dentro da bolsa, deveriam estar no meu rosto.
A coluna já não me ajuda muito. As pernas doem. A pressão nem sempre é minha amiga. Minha glicemia não é flor que se cheire. Os ovários me pregam peças. A pele está cada vez mais ressecada e obviamente a cara está se enchendo de rugas. E é difícil internalizar que alguns cuidados serão necessários, que a alimentação precisa ser controlada, que os exercícios físicos são necessários, se eu quiser de verdade que esta seja a metade da vida e não o final. Pelo menos o pai e a mãe demoraram horrores para ter cabelos brancos. Os meus nem começaram a aparecer!
Mas estes ônus fisiológicos não se comparam em intensidade e importância ao vigor interno. À medida que o corpo envelhece, a mente remoça a olhos vistos!
Neste aniversário de 40 anos, só quero agradecer à vida por tudo o que vivi até aqui e pela possibilidade de ter um futuro tão interessante pela frente. E se posso pedir alguma coisa, apenas que eu envelheça com dignidade.
É muito bom chegar aqui com tanto chão caminhado e na bagagem tantas histórias para contar. Mas é ainda melhor olhar o horizonte à frente e ver muitos caminhos a percorrer e projetos a concretizar.
Feliz aniversário, Mariazinha! TU MERECES MUITO!!!!!!

domingo, 16 de fevereiro de 2014

O Bonsai

Sempre achei muito bonita a arte do bonsai. Há alguns destes seres que são verdadeiras esculturas vivas, moldados por mãos pacientes e habilidosas.
Tempos atrás, ganhei de uma amiga uma miniatura de pitangueira. Ainda jovenzinha, idade denunciada pelo caule pouco desenvolvido, a pequenina ia muito bem em seu vasinho. Caprichei nos cuidados: podas de galhos e raízes, regas adequadas, muito carinho. Isso durou algum tempo, mas em detrimento de todos os meus esforços, minha pitangueira-bonsai não viceja. Ela está ali, cabisbaixa, com suas folhinhas pendidas, como pendem os braços pesados de quem desistiu da vida.
E eis que me ocorreu uma ideia, uma epifania. Ela não foi feita para isso.
Criar árvores que deveriam ser enormes em espaços tão restritos é como criar pássaros em gaiolas: não foram feitos para isso.
Quem de nós, em algum momento da vida, não sentiu vontade de se expandir, de ocupar um espaço bem maior, num espreguiçar longilíneo e amplo, sem restrições, sem limites?
Estou me sentindo bem assim neste exato momento. Sinto minhas pernas aprisionadas num pequeno vaso que me impede de crescer e ser tudo aquilo que eu nasci para ser. Como um pássaro na gaiola, estou cantando para o nada, cantando para ninguém, ou ao menos cantando para ninguém que realmente tenha importância.
Sou o bonsai que não tem mais para onde crescer, que vai se moldando à vontade alheia, sem poder ser aquilo que ele é de verdade: uma árvore.
Não tenho por hábito o comodismo e, diferente de um bonsai ou de um pobre pássaro engaiolado, posso agir sobre o meio e mudá-lo. Posso agir sobre mim e mudar-me.
Mas enquanto as mudanças que encaminho para a minha vida não se concretizam, vou libertar minha pitangueirinha. Será plantada em um solo amplo e fértil, onde suas raízes possam ir até onde quiserem, onde sua copa não será mais podada, onde será aquilo que verdadeiramente nasceu para ser: uma grande e linda pitangueira, vestida de noiva no meio do inverno, coberta de pitangas coloridas no final da primavera, vistosa e majestosa como cabe a uma árvore.
Minha amiga haverá de compreender que o presente que me deu merece mais de mim do que água e tesoura.